sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Cena # 117 - O Mayasutra... (Jornal Público, suplemento Fugas, 08.02.2014)



Demasiado tempo no check-in até que o Simão abriu a goela e  nos tornaram prioritários. Umas voltas pelo freeshop, tempo para o pequeno almoço reforçado, constato com prazer que, em Portugal, o nível de vida é alto, em Estocolmo paguei mais barato. Sala de embarque, o Vasco já dorme, o Simão, vidrado nos aviões que descolam
- Avião, avião, anda cá!
Mais espera, e a ordem da torre. O Airbus faz-se à pista, já leva uma hora de atraso, estanca, por fim, à entrada da dezassete, trinta e cinco.
- Papá, papá, México!

Chichen Itzá. Os maias criam que a Terra se assemelhava a uma plataforma que vagueava num imenso oceano (onde já li isto?), com riscos e bolas já detinham o sistema vigesimal e, portanto, já conheciam o vinte a matemática, contavam trezentos e sessenta e cinco dias e, mais sagazes e sem sindicatos, dezoito meses, dezoito salários e, talvez pela insustentabilidade, os espanhóis tenham intervindo. Como amigos, claro.
El Castillo, a imponente pirâmide quadrangular em honra de Quetzalcóatl, domina o zócalo, guardião das vozes e segredos toltecas.
Para oeste, contíguo ao Templo de los Jaguares, a imensidão de pok to pok, o juego da pelota onde literalmente se jogava a cabeça dos que perdiam: Por sorte, que a religião presenteia os crentes com miminhos, assegurava-se uma vida nova, estilo prémio de consolação. No extremo oposto, os Baños de vapor, com qualidades terapêuticas, pudera, iam lá os vitoriosos aliviar aquela estranha tensão muscular no pescoço...

Os xenotes são poços naturais, onde se acede por escadas espiraladas, uma torre invertida da Regaleira em que, dos nove círculos, resta o Paraíso e se existe cruz templária, as águas turquesa e os pequenos peixes, de seda, negros que vagueiam à superfície, dissimulam-na melhor que Manini o fez com o(s) Milhões. Do teto, pendem estalactites e as finas raízes das árvores que, desde trinta metros acima, atravessam, toda a galeria e pipetam tranquilamente a água.

No extenso areal, com tela de coqueiros e palmeiras, cabe tudo: chapéus de colmo e espreguiçadeiras na água, bares de praia, tequila Viuda de Romero - sim, capaz de ter morrido disso - e ingleses de Corona na mão, que de manhã se começa o dia, totopos com guacamole, tostadas e tortillas com chile jalapeño e, à frente, um asterisco com cinco malaguetas, dá para pendurar a camisa, ritmos latinos, disco, mariachis e concheras, onde há areia, há barulho e animação e onde há rocha só dá iguana, o Simão e o Vasco debruçados nos lagartos,
O Simão:
- Crocodilo, dança! (versão caraíba-remix, do Crocodile Rock)
E o Vasco, fanático da limpeza:
- Papá, a linguana está suja! Anda, linguana, vem tomar banho!

Quem nunca o fez, atire a primeira pedra e o meu Simão foi mesmo o primeiro a aliviar a bexiga nas águas tépidas do Mar das Caraíbas! Talvez por isso, Chaac, o deus da chuva e dos raios, não nos esqueceu. Confinados aos comes e bebes do hotel, o Simão e o Vasco - Zapata e Pancho Villa - também não e, sem praia, mostraram-se inigualáveis a azucrinar-nos a massa cinzenta!
- Um quilo de paciência! - tranquilizou-me o António, com uma pancada no dorso.
- Não, é mais um grama de paracetamol...

Adorámos, para a próxima vamos sozinhos, comprei um chapéu para ir ao mexicano de Algés, pago em dólares que não querem pesos na mão, meia dúzia de livros e o Mayasutra - visto e praticado, Dai Maya? - com graus de dificuldade e tudo, algumas com os pés no chão, vira o disco e toca o mesmo, ideias também eu tenho,
Receio é partir o resto...









2 comentários :

Unknown disse...

Excelente texto amigo. Assim ficam retratados estes dias de aventuras em terras Mayas com a a prol. Para mim foi mais uma "boa ventura" ter-te conhecido. O meu cardápio de amigos aumentou em numero e qualidade. Abraço :)

Jorge Santos Forreta disse...

Obrigado à "Fugas"/"Público".
Publicada em 08.02.2014.

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