domingo, 11 de fevereiro de 2018

Cena # 1659 - Histórias do Rio, dia 3.

                     
                                        
Gaspar de Lemos sabia ao que vinha,
O Posto 9 é o da garota, Helô Pinheiro; trocada a Baía pelo Rio, assim ficou, de janeiro, fevereiro e março e com nickname: cidade maravilhosa.

O culto do corpo e da cirurgia plástica, vinte e dois a correr atrás da bola: para o carioca tudo é relativo, as contas por pagar, o semáforo vermelho, uma mera informação,

Correr no calçadão e na onda que se estende do morro do Leme aos rochedos do Arpoador, sunga e havaianas,
Micos e thraupinis de mil cores, os hippies e a Banda de Carmen Miranda, Ipanema é gay-friendly e outra fruta, em Copacabana manda a bunda e a desbunda,
Água de coco e o Sindicato do Chopp!, o vinho do caneco e o boteco pé-sujo, bolinho de camarão com catupiry e o PF, prato feito: caldinho de mocotó,
Ao ritmo das sementes do caxixi e do berimbau, o Circo Voador e o chorinho na noite de domingo, porque amanhã é segunda,
Os quebra-molas e quebra-coluna e as ruas de sentido único cujo sentido varia com a hora do dia, o trólei de madeira pendurado de gente que se equilibra nos Arcos da Lapa, os morros graníticos e o Cristo no Corcovado,
A passagem de ano de, e em branco, macumba e oferendas a Iemanjá, mãe dos orixás,
O carioca vive a cidade e os abdominais, tablete de chocolate.

Gosto do Rio desigual, que os arquitetos reclamam uma catástrofe: o passado colonial nos edifícios do centro e, mesmo, o modesto Palácio Imperial que albergou a Corte mais os piolhos, e de Santa Teresa, abrigo de músicos e de artistas, e do maior, Ronnie Biggs, o barroco e as talhas de S. Francisco, as mansões neoclássicas da Urca e os nenúfares do Jardim Botânico,
E o Cristo Redentor, imponente desde o Cosme Velho, onde peguei o funicular: meia hora de subida e só lhe percebi o contorno majestoso, o nevoeiro engoliu os trinta metros de estátua, pois bem,
Implodiam o Rubik deslavado da Petrogás e, para mim, estava feito; mas não perfeito, dista anos-luz da Europa, um oceano nos separa.

Trezentos e sessenta graus e a mil e trezentos metros acima da baía, ergue-se o Pão de Açúcar: Botafogo e o Flamengo, a seus pés, as praias de Copacabana, Ipanema e Leblon e os verdes da Tijuca...
A melhor vista do Pão de Açúcar: ao entardecer,
A melhor vista do Pão de Açúcar: iluminado à noite, desde o Mirante de Dona Marta,
Parece a mesma coisa, não é: trepei no bondinho e não trepei na morena que se dispôs à fotografia comigo e que não conheço de lado algum, mas que os meus amigos invejam...

"It´s all true!", nos dias que Orson Welles ocupou o Copa, cinco garrafas de whisky voltavam vazias... O documentário nunca foi para o ar mas a mobília voou pelas janelas...

A Portela, azul e branca, a Mangueira, rosa e verde, os sambas do Martinho, na Unidos de Vila Isabel,
O Brasil é o país do carnaval, já o notara Jorge Amado,
E é festa, com raízes dionisíacas, o povo acorre em massa e mete a mão na mesma, trocam-se copos, carícias e infeções oportunistas...
Começa na sexta, com a entrega das chaves da cidade ao rei Momo, Abre-Alas: à Comissão de Frente, ao Porta-Bandeira e ao Mestre Sala, aos sambistas e aos batedores de carteira!





                                                                          II



"Violento não é o RIO, mas as margens que  o comprimem..."
                                                                                             Brecht.

Mais de trinta dias no Rio, nunca temi, jamais me senti mais cagado que pau de galinha mas,
Gostaria de viver na cidade maravilhosa?,
O Rio é amor à primeira vista!, dependendo do ponto de vista, não,
Incomodamente desigual, o que é de menos também não presta,

A classe média-alta vive no Leblon e na Barra, em luxuosos duplexes, triplexes e, sem complexos, esbanja na Visconde de Pirajá e casa na Cantuária,
Depois há "os outros": os favelados, a cidade dentro da cidade, que sobrevive no desenrasca e do arroz com feijão,
Há dois Rios e um Rio os separa.





                                                                        III



Almoço de médicos legistas,
A Luísa estagiou em São Paulo, o primeiro caso, de PAF*, engraçado, uma doença dos pezinhos, por aqui..., pensava naquilo e já caía outro PAF: Projétil de Arma de Fogo, dois para começar,

A Laura(,) também (,) andou mês e meio pelo Rio de Janeiro, e lá viu do mesmo: penduradas no pé, a justificação, Intoxicação por Chumbo ou, traduzida por graúdos, uns balázios de pistola, uns vinte por dia.

Isto dos orifícios de saída e de entrada é muito bonito nos livros, custa a entrar,
Vem da prática:
Os técnicos  viram vezes de mais e viram o corpo vezes de menos: um de entrada, dois, três, quatro e cinco, um, dois e três de saída,

- Olha doutora, estão duas balas aí para dentro!












*PAF (Port.): Paramiloidose Familiar, "doença dos pezinhos".

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